12 de out. de 2011

O DRAGÃO INTERIOR

NINO BELLIENY

Ele surge sem nenhum tipo de aviso.Vem em forma de um defeito no celular, na TV, no computador e principalmente no carro. Vem no meio sorriso da esposa, no olhar vazio do patrão, na meia-resposta do sócio, no grunhir do colega de trabalho e em dezenas de outras possibilidades aborrecedoras. 

Pode aparecer voando já de manhã, antes mesmo do abrir das pestanas, cuspindo fogo e ruflando as asas sobre a cama, empestando o ar com um cheiro ancestral.

Chamar por São Jorge? Fugir pela janela? O Dragão Interior é insistente, quer torrar os neurônios da vítima e dilacerá-la em segundos. Sobrevive dos medos e incertezas, quanto mais duvida houver, lá estará, crescendo serpente alada no invisível de cada um.

Tem vários nomes e apelidos, disfarces e camuflagens, mas, é dentro do coração onde melhor se aninha. Instalado, se procria e espalha a prole pela língua, caminho mais fácil para ganhar outras almas e mentes. 

Voa em palavras amargas contra um amigo, em doses de saliva venenosa se banha, vicejando no elogio pérfido e zombeteiro, na inveja mal dissimulada, no descarinho com a família, na opressão ao subalterno, na fofoca giratória contra qualquer alvo humano. 

O Dragão Interior é tão antigo quanto nós, tão espelho e reflexo como as mansas águas de um lago escondendo sob si a vida selvagem de seus habitantes, peixe grande contra peixe pequeno. 

Vencê-lo não é impossível, embora momentâneo. Exige, contudo, boa armadura e espada bem temperada, enfrentando-o dia após dia, derrotando aos poucos, decepando as asas, eliminando o hálito, mesmo sabendo que ele pode voltar em alguns dias, semanas ou até mesmo minutos. 

De todo não é mau. Em incertos instantes, é ele quem poderá salvar-nos de outros dragões bem piores ainda, vindo de outras direções... vindo de outras cavernas ao redor.

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