20 de out. de 2011

ANABELLA

NINO BELLIENY

Onde corre todos os dias, ao redor de um lago pequeno na chegada de sua cidade também pequena, para e às vezes, o reflexo que vê é só uma tristeza mais profunda do que o próprio lago. 

As águas são tranquilas, os círculos formados pelas pedrinhas atiradas pelas crianças e suas babás sonolentas provocam ondas singelas e silenciosas, mas até nisso, ela e o lago se parecem. 

Quem a vê nas raras festas ou na escola onde ensina a história do mundo e oculta a própria, logicamente jamais irá perceber debaixo daqueles olhos sonhadores pintados de águas mansas, o redemoinho constante, os peixes pequenos perseguidos pelos grandes, a vida aquática em ebulição letal. Sobre, é tudo mansidão. 

Superfície lisa de um imenso dia de sol, barquinhos de papel, casinhas borradas ao longe no morro, casais de namorados, a placa de “proibido pescar“ e ela comendo em círculos a vida em volta do lago. 

Tem tantos sonhos espatifados guardados em potes de maionese deixando pequena a estante onde tudo guarda como uma coleção preciosa. Tem tantos planos devastados e vontades incompletas por causa de um único amor demolidor. 

Agora é esta mulher envelhecendo em barcos de saudades partindo todos os dias para um lugar secreto onde ancora e vive outra vida ao lado do único amado, exato aquele que nunca lhe deu valor. 

No porto onde as portas se abrem e entra em mundos imaginários é feliz como uma rainha no topo da escada para o céu onde anjos lhe refrescam as faces com sopros divinos e ninguém lhe enche o saco, lhe perturba a paz. 

Só quer viver de saudade, de projeções do que poderia ter sido e jamais será. E daí ? Ali ela é feliz. Quem quiser que encontre a maneira adequada e pessoal. Ela, já estendeu a rede, dali, ninguém irá tirá-la.

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