1 de out. de 2011

A MORTE

NINO BELLIENY

A morte não tem compromisso. Chega quando, aonde e como quiser. Não tem obediência a dar a quem vem buscar nem a ninguém. Tem objetivos e não apontamentos. Simplesmente surge. 

Pode mandar sinais sobre a iminente chegada, mas, não os garante. Muda fácil de ideia, de rumo e de prosa. A morte é brincalhona, faz o que bem desentende.

Virá numa manhã de sábado, numa bonita tarde de domingo, em um meio-dia de uma segunda-feira. Quarta, quinta, sexta ,terça... não há ordem para a morte nem dias em seu calendário. 

Logo, não há calendário. Muito menos agenda. Ela estará no exato instante do minuto correto beijando a face do escolhido e levando sem nexo o fôlego da pessoa amada, da pessoa boa e da pessoa ruim. 

Não tem simpatia nem aversão, vem de mansinho ou violenta, vem... e vai. Será amaldiçoada e de nada adiantará. Será evitada nas conversas e de nada valerá. 

Indiferente, insolente, implacável, são alguns de seus prediletos adjetivos. Atinge ao que está no ponto mais alto do poder. Surfa na onda mais forte da juventude. 

Tanto faz... ela desfaz. Sempre voraz, faminta, sedenta e do mesmo modo tranquila em sua labuta. Não se corrompe, não aceita negociação, não há vantagem que a seduza. No acaso e no ocaso, no deserto das palavras e na multidão dos silêncios. 

Incompreensível. Inesquecível. Imperturbável. Insondável. Está em todas as religiões, nas portas dos templos, escrita nas pedras. Não permite a fuga. Todos os caminhos levam à ela. 

Tão antiga como o próprio tempo e portanto, tão moderna. Democrática, versátil, mágica, petulante, competente. Por muitos desejada, cultuá-la não garante regalias. Cada vez mais banalizada. Onipresente como uma celebridade. 

Cega,tudo enxerga; surda,tudo ouve. Dona de faro refinado encontra no vento a pista de seu próximo viajante e carrega-lhes em quantas quantidades quiser, às vezes, deixando algum para contar a história. Travessa, tosca, tétrica, tática, teatral e tímida.

Tudo nela se encerra e o impossível se completa. Não há não. Não há prorrogação nem disputa de pênaltis. Fim de jogo, fim de campeonato, fim. A morte não tem compromisso. A vida sim.

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