21 de set. de 2011

MÁGOAS MOVEM MOINHOS


NINO BELLIENY
Deveríamos ser como um rio fluindo para o Mar do Esquecimento. Viver do abraço das margens, enfrentando altos e baixos, enchentes e secas, aterramentos e lixo. Dias de muito e de nada, porém, seguindo em frente sem parar para saber se está certo ou errado, se deveria ou não continuar. Rio que segue lambendo o areal, dourando as pedras, matando a sede do gado e do povo, recebendo em troca esgoto e descaso. Sem reclamar, em frente ainda que, num fio d'água prestes a morrer. Velha sina. Nesta busca incessante cruzar com regatos e pequenos córregos, açudes, lagos, aumentar e diminuir o volume, sem descansar enquanto não chegar aonde irá se misturar com a Grande Mãe D'Água. Todas as aflições terão ficado para trás. O desprezo de grande parte da raça humana, as agruras naturais ou forçadas e o caminho irregular já mataram outros rios, mas, este vai conseguir. E toda a história trazida das barrancas por onde passou, das pontes onde namorados trocavam juras eternas como gotas de orvalho, das sombras de árvores onde pescadores sonhavam com o maior peixe da tarde, das casinhas pobres quase dentro da água, das cidades indiferentes, das poltronas boiando, toda a história irá se anular dentro de outras maiores no oceano voraz. Nem por isso deixará de correr e cumprir a missão.

Podemos aprender com os rios? Podemos. Entender que mágoas passadas movem moinhos, triturando pedras de amarguras e fracassos e nada resolvem. Aprendamos com os rios. Grandes ou pequenos, vão se somando e sumindo, sabedores que algo maior os aguarda. Sendo mais tarde, uma vaga lembrança. Enquanto desce para o oceano, vibra a força de uma breve vida. Intensamente aproveitada. Como as nossas deveriam ser.

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